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A Idade da Obra

Dizem que há uma idade para tudo. Há uma idade em que os seres humanos se passam a locomover sobre duas pernas, por exemplo. Há uma idade em que se perde a primeira dentição (exceptua-se aqui os chungas que também perdem a segunda dentição por desleixo…). Há a idade das borbulhas nojentas (novamente, há pessoas que – mais por falta de higiene do que por outra coisa – também nunca passam desta fase).

E há uma idade que eu já desconfiava que existisse, mas da qual sempre pensei estar muito distante: trata-se da temível Idade da Obra!!

A Idade da Obra determina que qualquer homem (é um fenómeno essencialmente masculino) que passe por uma obra, vala, estrada em construção ou mudança, páre e se detenha a olhar para o evento.

O meu ponto de viragem ocorreu hoje mesmo! Saí do escritório para almoçar e, no curto caminho que me separa do local onde tomo as minhas refeições, ocorria uma escavação para aquilo que julguei ser uma inseminação de cabos eléctricos e telefónicos. Não estava enganado. E como é que eu sei que eram funcionários da Portugal Telecom a instalar cabo? Porque, por algum estranho e quase sobrenatural motivo, eu parei e fiquei a ver os gajos a trabalhar!

Eu já tinha visto coisas destas a acontecer com outros. Rara é a obra de envergadura média que não possua alguns reformados a espreitar, provavelmente à espera de presenciar a descoberta dum filão de petróleo. Mas nunca pensei que me acontecesse tão cedo.

É verdade que ignorei os sinais. Estavam à vista de toda a gente, mas nenhum dos meus ditos amigos teve a bondade de me avisar! Longe vão os tempos em que só ia ao Aki para comprar lâmpadas. Agora, sinto-me estranhamente atraído pelas secções de ferramentas, aparafusadores e geringonças capazes de fazer merdas que nunca hei-de compreender.

O meu jeito para trabalhos manuais deve ser mais ou menos igual ao jeito que um rinoceronte teria para gerir uma loja da Vista Alegre. No entanto, inúmeras molduras tortas e interruptores fora das paredes ornamentam a minha casa, como pequenos troféus acusativos duma incapacidade que só eu teimo em não ver.

Perguntam vocês “Mas Toscano, tu tens 32 anos fresquinhos e cheios de vida, ainda és um gajo extremamente activo, inteligente, cheio de pinta e com um sex-appeal impressionante. Não achas que estás a exagerar?”. Pois eu acho que não. Há coisas que cada vez mais me atraem. Já não posso conduzir sobre uma ponte sem tentar imaginar como raio é que desviaram o curso da água para lá espetar os pilares. Juro que ando a bater-me pela construção do aeroporto na margem Sul de Lisboa, só para ter o prazer de poder assistir à construção duma nova ponte (ou, se tiver sorte, um túnel)! Até vou marcar uma semana de férias quando a obra estiver para começar, e sou bem capaz de ir para lá abancar numa cadeira de campismo com uma geleira e um boné!

Não acho que isto seja normal nesta idade. Mas cada vez mais reparo nestas coisas. Olho salivante para as mulheres que passam por mim na rua (já agora, vocês andam giras, caraças! O que é que andam a comer? Onde é que andaram até agora?), e fascino-me com isolamentos de poliuretano expandido entre paredes duplas! Será que há uma relação palpável entre um fascínio doentio pelo sexo feminino e uma obra numa estação de Metro? Afinal, diria eu se tivesse uma má língua, silicone é silicone, independentemente de onde quer que seja utilizada.

Pelos vistos, a Idade da Obra chega mais cedo a uns do que a outros.

E agora perdoem-me, mas tenho de me pirar. Caso contrário, os gajos da Portugal Telecom abandonam a vala e eu ainda quero vê-los a ligar aquele semáforo sobre rodas à bateria.




Lembro de um tipo em Loures (mas lá está, é uma terra esquisita) que faltava às aulas para ir assistir à construção da piscinas.

Talvez por serem municipais fossem mais importantes que as aulas de Quimica.


Se a idade de obra garantir posts com esta qualidade, então é muito bem vinda!


Semelhante ao voyeurismo mórbido de que a grande maioria é atacada quando passam pelos destroços de um acidente de viação.


Mas isso é diferente. Isso é a chamada Idade do Sangue. Começa sempre mais cedo, normalmente quando passamos de carro por um acidente e ouvimos os nossos pais a dizer “Filho, não olhes…”.

A Idade da Obra costuma ser mais tardia. Já não posso falar mais sobre isto. Estou traumatizado! (e a roer-me para não ir ver se os cabos já estão enterrados ou não…).

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