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Férias a pastar

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O turismo rural está na moda. As quintas reclassificadas nesse sentido, nos dias que correm, oferecem não apenas o requerido descanso e ambiente caseiro que tantos veraneantes procuram, mas também um conjunto de modalidades interessantes como ordenhamento de cabras e passeios de tractor.
Mas a última moda é, sem dúvida, das mais interessantes.
Trata-se da Quinzena do Pastor.

O processo é simples e merece ser ilustrado através do exemplo do leitor Francisco Gamboa (não é o seu nome verdadeiro), que nos chamou a atenção para este fenómeno.
Francisco entrou em contacto com o DQD para partilhar aquilo que classificou como uma experiência única. Por uma variedade de motivos (nomeadamente, ser gestor numa empresa de capitais públicos), não quis ser identificado. Deixamo-vos com as palavras dele.

“Toda a gente sabe que o turismo de habitação rural está na moda. E dado o emprego que tenho, estou numa posição privilegiada para saber quais é que são as melhores casas de sector. Costumo veranear com a minha esposa. Mas desta vez, por uma variedade de motivos que não lhe interessam saber, fui sozinho. Estive hospedado numa quinta ali para os lados de Vila Pouca de Aguiar, que é uma terra que fica algures entre Chaves e Vila Real.

Estes sítios já costumam ser interessantes por causa das modalidades que praticam. É possível ordenhar cabras, assistir à lida agrícola, andar de tractor, tomar banho em tanques enormes transformados em piscinas, etc. E desta vez tinham também uma coisa que me pareceu interessante e que era a quinzena do pastor. A ideia era passar quinze dias como um pastor transmontano, no campo com os animais.

Eu ainda pensei que fosse uma coisa engraçada. Imaginei-me sem ninguém à volta, apenas com um rebanho de cabras ou ovelhas, e um fiel cão para me fazer companhia. Imaginei-me também a ter tempo para passear pelos campos, ouvir música no meu iPod e, quem sabe, fumar um pouco de erva (com cuidado para não provocar incêndios, claro). A única barreira que eu impús a mim mesmo foi a utilização duma bóina. Isso é que eu não faria! Acredito que o sol até estivesse quente, mas é para isso que foram inventados os protectores solares.

Mas a realidade foi muito diferente…
Fui abandonado num descampado enorme e meteram-me a dormir numa casa em ruínas lá para o meio dum monte. E acredite que eu ainda tentei descobrir o caminho de volta, mas perdia-me constantemente. É que estamos a falar de hectares de terreno sem nada à vista no horizonte!
Confesso que ainda achei piada no primeiro dia, pois julguei que me viessem buscar ao fim da tarde. Mas ninguém apareceu…
E por ali fiquei, com um cão, catorze ovelhas e duas cabras, sem qualquer tipo de mantimentos, sem sequer ter rede no meu telemóvel para poder chamar alguém.

Os primeiros dias foram um bocado desesperantes. Não sabia bem para onde me havia de virar. Estava a passar fome! E se não fosse a existência de um poço ao lado da casa, provavelmente teria ficado desidratado. Felizmente, lá descobri umas árvores de fruto a um quilómetro do casebre e consegui comer alguma coisa. Mas as noites eram a pior altura. Rapei um frio descomunal, porque a casa era de pedra (e você deve imaginar como é que são as noites no norte do país). Cheguei a achar que tinha uma pneumonia quando, numa das noites, tossi sem parar e fiquei sem voz.
Mas depois vim a saber que apenas tinha ficado uma semana a tossir e, por isso, é que tinha ficado sem voz. Mas como é que eu podia saber? Eu não sou médico, pois não?

A primeira semana pareceu-me um mês!
Estava sujo e porco, não trocava de roupa há sete dias, tinha a barba por fazer, e jurei que ia processar o raio da quinta quando me viessem buscar!
Mas foi só a meio da segunda semana que comecei a aceitar a experiência de outra forma.

Devia ser Quarta-feira da segunda semana quando dei comigo a lamber alguns rochedos (o meu corpo necessitava de sal) e ocorreu-me que talvez tivesse sido assim que nasceu o conceito das Pedras Salgadas.
Ora a empresa das Pedras Salgadas (que fabricam a bem conhecida Água das Pedras) é uma empresa nortenha. E, segundo estou em crer, nem ficava longe dali.

E foi então que me senti iluminado!
O meu abandono às forças da natureza foi, sem dúvida, o motor impulsionador das melhores férias que já tive! Compreendi que não sou um deus apenas porque tenho uma empresa de cem pessoas a funcionar a meu mando. Compreendi que programar as minhas férias e manter a ilusão do controlo sobre o meu tempo seria disparatado, pois é isso que faço enquanto trabalho.

Durante quinze dias, estive ali exposto às intempéries, convivi com animais, cheguei mesmo a pastar com eles nos últimos dias, e até relações sexuais tive com uma das cabras, enquanto os restantes animais assistiam. Enfim, comportei-me como um verdadeiro pastor!

Por isso, caro André Toscano, deixe-me dizer-lhe que isto foram as melhores férias da minha vida! Eu saí da Quinzena do Pastor como um novo homem. Entrei arrogante, estúpido e a julgar que sabia tudo sobre a vida. Saí de lá a sentir-me um com a natureza, e estou a pensar até em deixar crescer uma barba e desinstalar os ares condicionados lá de casa.

Pode publicar a minha história, se assim o entender. Escrevo-lhe pois gosto das coisas malucas que você publica no seu site, e talvez ache algum espaço para uma história verídica como a minha.
Só lhe peço que não publique o meu nome verdadeiro.
Obrigado.”

E decerto concordarão que é difícil não nos sentirmos humildes depois de ler palavras como estas…




Talvez desbrave caminho para a “Quinzena dos Tuaregues”. Mandávamos os politicos todos para o meio do Sahara e “esqueciamo-nos” deles por lá. Pelo menos, aí, duvido que conseguissem arruinar alguma coisa. E quanto a instintos de sobrevivência e reprodução mais primários, não iam estranhar nada. Já passam o tempo a f******-se uns aos outros…

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