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Cappuccinozol

Sou um assíduo leitor do jornal Metro, um diário de distribuição gratuita de Lisboa (curiosamente, distribuído no… Metro). Acho que me tornei um fã incondicional desta publicação quando anunciaram que tinham atingido o segundo lugar no ranking de jornais mais lidos da região de Lisboa, para dias depois irem de férias durante um mês.
Hoje, este jornal trazia uma notícia bombástica. O título a negrito (será a palavra “negrito” politicamente correcta?) anunciava: «Sabor a “Cappuccino” é o preferido». Transcrevo a seguir a notícia na íntegra:

Os doentes com cancro preferem o aroma a “cappuccino” para os suplementos nutricionais. A conclusão é do “estudo sobre o paladar dos doentes oncológicos”, uma investigação realizada com 104 pacientes oncológicos, sujeitos a várias terapias contra o cancro.

Isto é que é jornalismo de qualidade! É o tipo de serviço que informa, mas que, simultaneamente, faz pensar… Pensar, por exemplo, sobre a natureza desta estranha e oculta ligação entre o cancro e o cappuccino. O estilo taxativo da primeira frase da notícia leva a crer que todos os doentes com cancro desenvolvem uma afinidade por tal aroma; será que mesmo aquelas pessoas que odiavam cappuccino, passam a gostar quando afectadas por tal doença? E, se sim, será que o cancro foi uma doença desenvolvida pela indústria do café?

Outra coisa: quem é que será que conduziu este estudo? Terá sido a comunidade científica? Terão os médicos dedicado parte do seu tempo à investigação da nuance gustativa mais adequada ao palato dos pacientes?

-Então, Sr. Anastácio? Como é que estamos hoje?
-Não muito bem Sr. Doutor… Já se sabe, as dores e as drogas que me andam a dar mandam -me muito a baixo…
-Ahh, pois, pois. Mas olhe, tenho boas notícias para si!
-Não me diga! Estou melhor, é isso? O meu cancro está a regredir?
-A regredir?! Nem pense nisso, homem! A boa notícia é que a malta do laboratório anda a desenvolver um suplemento que é de comer e chorar por mais!
-Então e o meu estado de saúde, Dr.?
-Sr. Anastácio, não seja egoísta que isso não lhe fica nada bem! Só podemos dar atenção a uma coisa de cada vez. Agora andamos a concentrar os nossos esforços nisto dos suplementos.

Ou terá sido levado a cabo por uma empresa independente de estudos de mercado? Ou andam com pouco que fazer, ou o cancro é um negócio rentável. Deve de haver por aí uma empresa de suplementos nutricionais apostada em rebentar com a concorrência, e em ficar com o dinheiro todo aos doentes oncológicos. Quem sabe se não vamos ver brevemente, nas nossas televisões, publicidade dirigida a este (aparentemente importante) nicho de mercado, sobre o novo e saboroso suplemento com sabor a cappuccino:

«- A quimioterapia deixa-me de rastos… Eu costumava chegar a casa exausto, e ainda me via obrigado a engolir aqueles suplementos insípidos. Mas agora há o novo Cappuccinozol. Toda a energia dos melhores suplementos, com o melhor sabor do autêntico cappuccino italiano. A minha vida ganhou outra alegria! Experimente já!»




E não foi noticia só no jornal Metro, também no JN.

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