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Publicidade

A existência de um circuito de marketing na sociedade actual não podia ser prova mais irrefutável de que o ser humano ainda se encontra numa fase muito primitiva da evolução.
Por haver dinheiro para gastar que precisa de circular, os produtores de bens contactam empresas de marketing e publicidade de modo a estudarem a melhor hipótese de apresentar um produto novo e o impingirem a quem não precisa dele.
Mas este não é mais um artigo ou dissertação acerca de marketing ou publicidade. Não só não possuo qualificações para falar abertamente desses assuntos, como já existem inúmeras publicações no mercado dedicadas a essa área. No entanto, sei o que me chateia. Acho um piadão enorme quando vejo aqueles anúncios de “A publicidade é o direito à escolha”. Quando eu me preparo para comprar um produto qualquer, não fico a torturar a minha bexiga durante os quinze minutos de publicidade que separam um filme em pedaços. Simplesmente, saio à rua, compro o mair número de revistas possível sobre a matéria em questão, e leio-as na casa-de-banho, unindo assim o útil ao agradável (qual é o útil e qual é o agradável fica em suspenso…)
Porém, basta ver a maior parte dos anúncios transmitidos na televisão para perceber a mentalidade ou o grau de profissionalismo de quem está por trás da sua concepção. Por cada anúncio interessante e notável, observamos cerca de quinze ou vinte que são completamente abimbalhados, semi-profissionais, pretenciosos, pouco imaginativos, ou simplesmente parolos.
Isto leva-me a crer que todos os criativos publicitários não podem ser trogloditas retardados, mas sim que esta classe profissional deve ser vítima do mesmo monstro que tantas outras áreas vitima: o cliente. Não deve haver nada mais frustrante que trabalhar num projecto encomendado, para semanas depois um mostrengo qualquer -míope, barrigudo e seboso- querer influenciar o resultado com o seu maravilhoso toque pessoal. Convém referir que foi este mesmo mostrengo – o cliente- que encomendou o referido trabalho semanas antes.
Portanto, embora frustrante para o publicitário, um anúncio cretino e parolo acaba sempre por vir parar aos ecrans de televisão por dois motivos muito importantes. O primeiro, é que o cliente julga que sabe o que quer. Afinal, também ele é comprador de muitos outros produtos, e julga que isso o torna remotamente mais esclarecido na arte da criatividade publicitária. Até aqui tudo bem, porque este fenómeno se verifica em muitas outras áreas. Qualquer ginecologista julga conhecer as mulheres melhor que os outros homens, por passar os dias a revirar-lhes as partes íntimas. Os taxistas, por passarem o dia a conduzir, julgam que a estrada é mais deles que dos outros. E por aí fora.
O segundo motivo é que um mau anúncio televisivo, embora não sendo abonatório das qualidades e virtudes da agência que o produziu, é mais prejudicial para o cliente do que para quem o realizou. Ou seja, a partir de um anúncio de empresa X ou produto Y, consegue-se facilmente perceber se essa empresa é dinâmica, moderna e solta (logo, com qualquer coisa de bom para oferecer), ou se é chata, ultra-conservadora e quadrada (cujos produtos, provavelmente, não passam da mesma merda de sempre, remoída e apresentada numa embalagem nova).
Não seria óptimo se as empresas pudessem ser multadas consoante o grau de parolice dos anúncios que lançam para os meios de comunicação social? É que o problema é mais grave do que se pensa. Hoje em dia, qualquer sítio em que o ser humano fixe o olhar por mais de 5 segundos é atreito a ter publicidade. Temos anúncios em cartazes, revistas, jornais, televisões, internet (este centro comercial gigantesco), caixas Multibanco, autocarros e metropolitanos, cinemas, nos céus (aquelas avionetas irritantes com anúncios crípticos do estilo “Cent prof Peq Party Albufeira”), etc. etc. etc. Não vai tardar muito até se começarem a alugar as testas das pessoas para colocar banners.
Deveria ser criado o MRPP (Ministério de Refreio da Parolice Publicitária). Este organismo teria a competência e autoridade para poder multar e/ou castigar todas as empresas cujos anúncios chumbassem num teste de parolice. O juri consistiria em dez pessoas: um artista visual, um actor, um músico, um especialista em imagem, um especialista em som, um escritor, um humorista, e três pessoas normalíssimas, se possível empregados de mesa ou revisores da Carris. Se o anúncio de empresa X passasse no teste, esta seria autorizada a lançar novos anúncios à vontade durante o ano seguinte, e por aí fora. Caso a mesma empresa chumbasse no exame de parolice, não só seria proibida de realizar e emitir anúncios durante um ano, como o director da mesma seria obrigado a pedir desculpas a 150 pessoas por mês, aleatoriamente escolhidas a partir da lista telefónica. Para grandes males, grandes remédios.
Nesta altura, está o leitor a perguntar se isto está a caminhar para uma conclusão lógica ou não. É muito simples. Se a publicidade é o direito à escolha (como eles dizem), o cliente estraga a publicidade mais conveniente e adequada, o anúncio publicita um produto inútil de uma forma imprópria, e o comprador adquire-o porque tem dinheiro para gastar, então o mundo inteiro não anda à procura de direito à escolha mas sim de estreitamento de opções.
E como eu próprio sou comprador, tenho me incluir neste lote.
Porém, continuo a gostar de anúncios e intervalos para ir à casa-de-banho.

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