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Indústria musical

Que eu ando a ser assediado diariamente por uma cambada de otários que não vão à bola com as minhas crónicas, já não é novidade nenhuma.
Lembrem-se de falar em liberdade de imprensa se algum dia forem assediados por publicarem as vossas opiniões num site como este!
Mas se eu pensava que ser ameaçado por um astrólogo era o melhor que poderia arranjar, eis que sou perseguido em plena auto-estrada por um elemento da Força Aérea portuguesa, provavelmente por ter dito em qualquer lado que os militares são todos uma cambada de inúteis que vivem da mama do contribuinte (se não disse isso, hei-de vir a dizer…). Mas não faz mal, porque a crónica desta semana é dedicada à maravilhosa indústria musical portuguesa.

A música é uma indústria. Como todas as outras, a indústria da música é regida por regras e abrilhantada por excepções. Infelizmente, é com grande tristeza que reparo na forma pouco inteligente e pouco digna em que os músicos (de um lado da cadeia) e os ouvintes (do outro) são tratados pelas editoras e pessoal responsável (a malta do meio).
Para a maior parte das editoras, a música não é uma forma de arte, mas uma forma de fazer dinheiro. Os músicos não são artistas, mas sim os fantoches que protagonizam esse espectáculo, literalmente orquestrado.
Mas ilustremos esta caminhada pelo pouco inteligente mundo da música com alguns exemplos.
O Acácio é guitarrista. Tem apenas dezanove anos, e toca desde os quinze. Até aqui, confinava as suas experiências musicais às quatro paredes do seu quarto. Achou que estava na altura de formar uma banda, e colocou alguns anúncios no jornal Blitz para esse efeito. Não tardou que obtivesse respostas. Agora, tem vinte e um anos, e já ensaia com a mesma banda há quase dois na garagem da casa que comprou na Reboleira (também se casou entretanto, mas isso não é relevante para esta história). A banda do Acácio chama-se Silêncio às Quatro, e até possui uma sonoridade original dentro do Trance-Jazz. Acham que está na altura de gravar uma maquete para enviar às editoras. A muito custo para eles próprios, entram em estúdio, gravam a maquete e enviam cópias para várias editoras.
Na altura em que os Silêncio às Quatro entram em estúdio, no outro lado da cidade Rui e Miguel observam atentamente um concerto dos Anjos na televisão. Rui tenciona seguir uma carreira de modelo, mas é recusado por diversas agências por possuir uma cicatriz debaixo do olho esquerdo. Miguel trabalha como empregado de mesa na Portugália da Almirante Reis.
Ao repararem na quantidade de miúdas que normalmente acorrem aos concertos de boys bands como os Anjos, decidem enveredar por uma carreira similar. Longe de serem artistas ou apaixonados pela música, acham que possuem uma hipótese de vingar, pois até são algo elegantes e gostam de andar com a pele bronzeada. Contactam então um conhecido que é especialista em computadores e música de dança, que lhes prepara meia-dúzia de “canxões” numa tarde. Ao tentarem gravar as vozes, deparam-se com o obstáculo de não saberem cantar como deve ser. Tudo bem! O especialista dos computadores possui o plug-in ATR1 da Antares na sua máquina, que é um programinha mágico que detecta o tom em que alguém canta, percebe qual o tom que ele queria cantar em relação à escala da música, e corrige a voz para o tom correcto. Afinal, se todas as boys bands e girls bands do mundo (incluindo as Spice Girls) usam essa tecnologia, porque raio não poderiam eles usar também?
Neste momento, é imperativo que surja um nome para a banda. Decidem chamar-se os Demónios. Enviam a maquete para várias editoras, acompanhada de fotos tiradas numa das agências de modelos que recusou Rui semanas antes. Por coincidência, ambas as maquetes dos Demónios e dos Silêncio às Quatro chegam às editoras ao mesmo tempo.
Somos, então, apresentados ao próximo elemento da cadeia, que é o A&R. A designação A&R vem da língua inglesa, onde as iniciais significam Artist & Reportoire. A&R não é apenas uma designação generalizada, mas também especifica um profissional que trabalha na estrutura interna da editora. É o AR (em português, o AH-Érre). O AR é, sem dúvida, o ser mais estranho da cadeia. Nos anos 70, o AR começou por ser um caçador de talentos que percorria bares e salas de ensaio à procura de músicos promissores, de modo a coagi-los a assinar um contrato discográfico para a editora em que trabalhasse. Hoje em dia, devido às editoras receberem dezenas de cassetes diariamente, o AR passou de caçador de talentos a um mero filtro de tralha. Tem apenas de se sentar na sua secretária com o caixote de cassetes que recebeu nesse dia, ouvir os primeiros quinze segundos das primeiras três músicas, e decidir se a cassete em questão voa para o caixote de lixo ou para o caixote que contém as palavras “A Considerar” escritas no cartão, com um marcador vermelho.
Ninguém sabe onde os AR’s habitam. No entanto, são vistos frequentes vezes a conduzir automóveis como Fiats Puntos e Opeis Corsas. Uma vez, persegui um AR desde que ele saiu da Valentim de Carvalho, em Paço de Arcos, mas vá-se lá saber como, perdi-o a meio do percurso! O resultado foi uma ordem de tribunal para me manter a uma distância mínima de trezentos metros dessa pessoa. Fiquei lixado! Só queria saber onde ele morava. Agora, como ainda não sei onde ele mora nem a polícia me diz, não tenho maneira de saber se estou ou não a desrespeitar a lei. Mas isto é outra história.
Os AR’s são normalmente formados em gestão, marketing, ou qualquer outra área não artística que os impeça de distinguir o som do saxofone de Jan Garbarek do grito de uma cabra maltesa com o cio. Andam normalmente vestidos com fatos azuis e possuem uma quantidade incrível de gel no cabelo, pelo que podem – a um olhar desatento- ser facilmente confundidos com um revisor da CP que também é “striper” em part-time.
Hoje, o AR Antunes recebeu, entre dezenas de outras maquetes, as cassetes dos Silêncio às Quatro e dos Demónios. Suponhamos que uma vez eliminada a primeira dezena de maquetes, sobram os Silêncio às Quatro e os Demónios. Os primeiros possuem alguma qualidade e originalidade, mas seria um produto difícil e arriscado de vender. Por isso, voam directamente para o lixo (imagino que nas cabeças dos AR’s portugas exista um sinal de proibição com as palavras “Originalidade” e “Risco” lá inscritas). Por outro lado, se os Demónios tiverem algum trabalho de produção e maquilhagem, talvez possam vir a ser a próxima sensação nacional.
Preto no branco, os Demónios ganham um contrato, e os Silêncio às Quatro ganham um valente chuto no rabiosque para aprenderem a não fazer música original e arriscada.
Será justo cair em cima das editoras desta maneira? Claro que é. Afinal, se os Tops estão repletos de música da treta, a culpa só pode ser delas. É nesta altura que as editoras e os AR’s nos tentam vestir aquela tanga típica de que só vendem o que o povo quer, blá blá blá, quando todos sabemos que o povo não come o que quer mas aquilo que lhe é dado.
As editoras (as maiores, pelo menos) têm listas pagas nas rádios, listas essas que, dependendo do contrato e dinheiro envolvido, determinam se a música X ou a banda Y tocará 10, 15, 20, ou 30 vezes por semana nessa rádio. Quem diz rádio diz televisão, pois todos esses programas televisivos de chacha dedicados à música, concursos da treta e afins, vivem sequiosos de conteúdo e, bem falados e com uns cobres à mistura, aceitam tudo o que as maiores editoras lhes enviarem.
Como a música e imagem de banda se vende através das rádios e televisões, não tarda muito todas as Marias Pituchas de 13 e 14 anos estão a correr histéricas para a discoteca mais próxima para comprar o disco dos Demónios. Sempre convencidas de que essa compra foi uma escolha pessoal e sem qualquer manipulação, claro. Entretanto, as editoras continuam a dar-nos a balela de que só editam o que o povo quer. É mais um ciclo vicioso que não leva a lado algum, no estilo do ovo e da galinha.
Quem é que perde nisto tudo? Perdem as bandas e músicos decentes, cuja música de qualidade nunca será ouvida. Perde o povo, que é tratado como um idiota facilmente influenciável (que, de facto, é). Perdem as bandas que ganham o contrato, pois nunca hão-de ver a cor do dinheiro se não venderem uma quantidade considerável de discos. Perde a televisão, que só transmite programas da treta que embrutecem mais do que distraem. Perco eu (a pachorra!). Perde o Carlos Ribeiro, que passou de locutor de rádio a “amigo do pimba”, mas que um dia ganhará uma valente porrada do meu carro quando eu tiver a sorte de ir a conduzir e o vir a atravessar uma estrada.
Apesar de ser ateu, dou graças a Deus pela internet e novos sistemas de distribuição musical, que não só são mais ecológicos como, num futuro não muito distante, tornarão o fenómeno musical muito mais justo.
Entretanto, cada vez que vejo novas boys bands e girls bands na televisão, passo o meu charuto para a mão direita de modo a poder bater com a esquerda na testa, enquanto aceno negativamente.
Mas eis que, em plena contradição com a minha linguagem corporal, exclamo “Já nada me surpreende!”




“Só estamos nisto por causa da massa”
Olha pá,se não forem os A&R são os músicos já instalados ou os empresários da musica…portanto siga a dança.No entanto é como dizes,esses cabrões andam a emporcalhar a música.E os critérios de criatividade são agora uma coisa do tipo:”…como é evidente Dino Meira não é Clemente…” e os ALTERNATIVOS são…”capelinhas”.
Portanto um artista deve expressar-se livremente e esforçar-se para que o vejam que é a parte mais complicada porque os gajos que controlam o negócio fazem dos ouvidos e dos olhos das pessoas penicos.


esta muito fiz continua assim
beijos fofos


lllllllllloooooooooollllllllllllll


Muito bom o texto…estou prestes a mandar o meu Cd (caseiro) de 13músicas para as melhores editoras…mas primeiro vou registá-las…caso elas não queiram, irei pô-las no myspace e youtube ate ganhar fama sem o apoio de ninguém…agora as coisas tem de ser feitas ao contrário 😉

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