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Astrologia e outras cientologias parolas

Desde que a minha coluna sobre Médicos, Medicamentos e Centros de saúde foi publicada na semana passada, recebi cerca de 95 emails! Desses 95 emails, 81 foram insultuosos (4 deles de fãs do Ricky Martin!). Dos restantes 14 emails, treze foram só elogios, nomeadamente de três médicos que trabalham em Lisboa. O último email veio com uma formatação estranha, pelo que não o consegui decifrar (mas calculo que fosse um elogio…).
Isto só bem corroborar uma teoria de massas muito interessante: as coisas só vendem se tiverem polémica.
Por isso, aqui estou eu novamente para vos chocar. E eis mais uma prova de que o ser humano não é inteligente: a existência da astrologia e toda uma gama de cientologias parolas.

Se todas as razões que provam que o ser humano não é inteligente fossem uma árvore, a astrologia ocuparia, sem dúvida, aqueles ramos mais altos, que chegam até a tocar noutras árvores (como a árvore da Parolice, por exemplo). Quem diz astrologia, diz espiritualismos cínicos, “ciências” ocultas da treta, tarot e cartas, cosmo-psicologias baratas, re-encarnações, cristais radioactivos, cientismos, e todas as outras bimbalhadas que me esqueci de mencionar.
O gabinete (ou a linha de valor acrescentado) do astrólogo actual é, sem dúvida, o confessionário de eleição de toda a sopeirada que se julga esperta mas que ainda “vai à bruxa”.
Com meia-dúzia de dados fictícios acerca de astronomia (atenção! Muita gente confunde a ciência que é a astronomia, com a parolice que é a astrologia), uma grande dose de senso comum e alguma lamechice à mistura, essa figura carismática que é o astrólogo desvenda-nos a sabedoria acumulada nos astros desde há milhões de anos. O próprio acto de ir a uma consulta astrológica é, por si só, uma contradição imensa. Se se é suficientemente estúpido para acreditar que a nossa vida é comandada pela posição dos astros no céu, então qual é a preocupação? O que tiver de acontecer, acontecerá. Ir à consulta não vai mudar nada.
Houve alturas em que me insurgia de raiva cada vez que via aparecer na televisão um desses mariconços maquilhados (olá, Miguel de Sousa!) a implorarem para que as sopeiras lhes ligassem, que não se iriam arrepender. Agora, permaneço calmo. Isso porque percebi que esses aldrabões e manhosas já coirotes que dão a cara na televisão (olá, Nelly Monserrat!) não passam de meros gestores que se encontram a explorar o negócio altamente lucrativo da ignorância. Regra geral, quanto mais iletrado um povo é (como o nosso e o brasileiro, por exemplo) maior é a probabilidade de aparecerem seitas religiosas com uma nova interpretação da Bíblia e astrologozecos como os que cá andam, capazes de convencer os mais influenciáveis da maior das tangas.
Mas não confundamos falta de literacia com atraso tecnológico. Os Estados Unidos, que se vangloriam de ser a nação mais avançada do planeta, possuem a maior quantidade de freaks e fanáticos por metro quadrado. E é por os Estados Unidos possuirem tantos fanáticos que não se conseguem dar bem com os fanáticos do Médio Oriente. São muito parecidos. Os americanos são árabes com cartão de crédito (e pistolas). Os árabes são americanos de turbante, a venderem passagens de Alá nas ruas como os americanos vendem aparelhos de ginástica na TV Shop. De resto, são ambos os mesmos animais. Para os europeus, é igual ao litro. Nós contentamo-nos em assistir a essas guerrinhas e amuos no Telejornal, e visitar o Egipto ou a Turquia de vez em quando para comer uns kebabs decentes e andar de camelo.
Mas não se pense que estas cientologiazecas se ficam por aqui. A (pouca) inteligência do ser humano normal é atacada a toda a hora por diversas formas de cientismo, cuja função são realçar a ignorância de cada um de nós de modo a que aceitemos uma mensagem sem grandes complicações. Por exemplo, gostaria de saber quantas pessoas me saberiam explicar o que é o ph de qualquer coisa. No entanto, no momento da decisão, milhares de pessoas preferem adquirir o sabão da marca X por terem visto no anúncio que tinha um ph neutro. A publicidade, mais que qualquer outra área, utiliza este tipo de truques o tempo todo. Num anúncio, temos micro-bolhas apatetadas a comer sujidade da roupa, com um ar semelhante ao Pac-man após uma refeição de sardinhas na Feira Popular. Noutro anúncio, temos pomadas anti-alérgicas com bio-álcool ou shampôs extremamente avançados, baseados em sebo de hortelã, que partem a caspa em pedaços para a água do banho os levar.
Mas em relação aos astrólogos, o problema não é tão complexo. É uma relação estritamente comercial, que oferece algum consolo mediante o pagamento de uma consulta.
Porque andava numa fase um pouco deprimida (que não estava prevista no meu horóscopo), decidi que a melhor maneira de pesquisar sobre este assunto era arregaçar as mangas e as baínhas das calças, e mergulhar numa consulta astrológica. Levei comigo um pequeno microfone, que usei para gravar a consulta num leitor portátil de MiniDisc (envio cópia a quem pedir). Colei o pequeno microfone no interior de uma das mangas do casaco com fita-cola, percorrendo o fio toda a minha manga esquerda até chegar ao bolso interior, local onde alojei o gravador. Eis a transcrição de parte da consulta.

(L=Lavagante; MS=Mestre Sousa)

L- Boa tarde -cumprimento o Mestre Sousa, com um sorriso meio amarelo e deprimido
MS- Boa tarde. Sr. Lavagante, não é?
L- Como é que sabe?! -pergunto, admirado, pensando em como é que o mestre Sousa conseguirá urinar com aquela quantidade incrível de anéis nos dedos.
MS- O Sr. Lavagante marcou uma consulta para esta hora, não foi?
L- Ah! Sim, claro! Mas o mestre Sousa sentiu-me a chegar, não?
MS- Bem…sim. Eu sabia que vinha. Vamos por aqui. Agradecia apenas que se descalçasse antes de entrar nesta sala. Se quiser, arranjo-lhe uns chinelos. -diz o mestre, enquanto me orienta para uma divisão qualquer da casa
L- Tem a certeza que quer que eu me descalce? Olhe que estou de meias de lã e o meu carro ficou um pouco longe… -gracejei, ficando à rasca em seguida, pois era suposto estar deprimido
MS- Não se preocupe com isso, amigo. -fui subitamente promovido a amigo.
L- UAU!!! -exclamei assim que entrei na sala de consulta. Foi a minha manifestação mais sincera do dia. Se a foleirice fosse pessoa, sem dúvida alguma moraria ali. Quase que verti uma lágrima, jurando baixinho que não me perdoaria por ter trazido um gravador em vez de uma câmara de filmar. O tecto da sala encontrava-se coberto de mapas celestiais, fazendo com que a sala se parecesse com um planetário rasca sem direito a electricidade. Ao longo de diversos armários, encontravam-se figuras de Buda, Jesus Cristo, Nossa Senhora de Fátima, Ganesh, etc. numa óbvia tentativa de agradar a uma variada clientela. Uma música meio aparolada, daquela onda New Age com flautas e sons da natureza, tocava em pano de fundo
L- Até a música é excelente! -menti, para tentar dar uma conotação diferente ao meu entusiasmo
MS- Fui eu que a escolhi. Você sabia que existem sons com frequências que transmitem paz e calma se estiverem em ressonância com o Cosmos, mas que nos deixam agitados se forem dissonantes?
L- A sério? -finjo que me deixo levar pela tanga do mestre Carl Sousa Sagan
MS- O truque está em encontrar um balanço. A vida é feita de balanços e compromissos.
L- Desculpe… de baloiços e comprimidos?! É que eu oiço um pouco mal…
MS- Não! Não! De BA-LAN-ÇOS e COM-PRO-MI-SSOS -diz o mestre Sousa, agora mais alto, ciente que está a falar com uma pessoa surda. Foi a única coisa que consegui improvisar para garantir que a conversa progredisse a um volume que garantisse a inteligibilidade da gravação.
L- Naturalmente
MS- Mas o que posso fazer por si?
L- Diga-me o mestre Sousa. É astrólogo, não é? -agora, eu estava na corda bamba. Como é que iria colocar a conversa num tom mais normal depois de uma boca destas? – Desculpe! É que eu ando tão deprimido e irritável…
MS- Pois, estou a ver. De facto, estou a sentir alguma energia negativa à sua volta -e nisto desata a passar as mãos à minha volta, sem me tocar, como quem está a limpar uma escultura ou a interpretar uma peça de dança contemporânea -É possível que seja devido à fraca conjunção de Júpiter com Saturno.
L- A sério?! -exclamo, fazendo um esforço para não começar a rir
MS- Como vê, está a acontecer agora -e nisto aponta, ao calhas, para um dos crípticos mapas celestiais, sabendo que eu não o perceberia.

Meia-hora desta conversa de chacha depois, lá consegui despedir-me do mestre Sousa, com a promessa de lá voltar passados quinze dias, altura em que a conjunção de Júpiter com Saturno estaria no seu ponto mais alto. Para trás, ficaram quarenta minutos de vida perdidos e 6.000$00 de consulta sem recibo. Comigo, trouxe a promessa de que as coisas melhorariam muito em breve, que teria sorte na procura de um novo emprego e que iria atravessar uma fase muito criativa. Não há dúvida, porém, que trouxe de lá boa disposição em abundância, especialmente quando ouvi a gravação junto de alguns amigos.
Por muito lentos e maus que os serviços da Caixa possam ser, se a astrologia possuisse um lugar na Ciência, sem dúvida que haveria nos hospitais e centros de saúde um gabinete dedicado a esse propósito, com o intuito de tranquilizar o avisar os cidadãos de desgraças ou felicidades vindouras.
Mas ninguém sabe o futuro. Nem médicos, cientistas, escritores, jornalistas, artistas, ou ditos visionários. Todos os que tentaram prever a maneira em que a sociedade iria evoluir falharam redondamente, a ponto de serem gozados à socapa anos depois. Na história da tecnologia, então, nem se fala!
E a prova disto é que o mestre Sousa previu que eu atravessaria uma fase muito criativa. A ser verdade, porque é que não consegui arranjar uma maneira decente de acabar esta crónica?




Olá!

Estive a ler sobre seu conceito acerca da Astrologia.
Na verdade teve uma experiencia desgraçada, diga-se, do pior que existe.
Poderia aconselhar uma pessoa decente, se quisesse experimentar, mas penso que não iria ou talvez nem conseguisse consulta, porque é de graça e tem muita gente à espera.
A Astrologia verdadeira em nada tem a ver com essa idiotice. Na verdade é um estudo bem mais sério. Todas essas revistas que publicam signos e baboseiras do género não ajudam nada, porque são, na verdade, tolices.
Também nada tem a ver com ler o futuro, no sentido em que as “sopeiras” estão habituadas.
Um mapa astrológico é uma matriz que permite a uma pessoa conhecer-se melhor. Uma leitura como deve ser, por um astrólogo digno, pode ajudar muito uma pessoa. Já experimentei e, de certo, faço parte da turma que gentilmente catalogou de ignorante, mas pode crer, foi uma consulta bem diferente da sua.
Cada um tem o Astrólogo que merece! Depende muito do que se procura. Se quer justificar a sua crença, encontrou o tipo certo. Parabéns!

Só para finalizar, quando desejar falar sobre um determindado tema, informe-se com as pessoas certas. Procure alguém com alguma cultura e sensibilidade e que perceba do assunto.
Peça que lhe indiquem um ser da àrea em questão que faça o trabalho com dignidade e sabedoria. Perfeito não será, mas assim não terá uma experiência tão foleira.

Agradeço a possibilidade de me expressar.
Tudo de Bom!

Luísa

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