Grandes Vultos Esquecidos da Nossa História: O português mais odioso de sempre.
Nota prévia: Os nossos leitores mais perspicazes (ou seja, todos) poderão adivinhar uma certa contradição neste tÃtulo. Afinal, se o homem é o mais odioso de Portugal, como é que pode estar esquecido? Pois é, mas como ficará claro, por vezes é possÃvel odiar alguém sem se saber que se odeia essa pessoa.
A lógica basta para chegar a esta conclusão. Na segunda-feira, num programa de televisão que, algo estranhamente, toda a gente já parece ter esquecido (faz de conta que não aconteceu nada), foi eleito o maior português de todos os tempos. Ora, se este é o mais adorado na pátria lusa, então o sacana que o lixou será o mais odiado. Parece-me óbvio.
V. Óscar Meirinho
Nascido no Vimieiro, corria o ano de 1940, Óscar Meirinho foi o filho único de Bento e Adelaide Meirinho. Nunca foi pessoa de grandes ambições. Dava-se por satisfeito com a vida pacata da sua terra-natal e, vivendo afastado dos grandes centros urbanos, nunca mostrou interesse por qualquer assunto especÃfico. Considerando estes aspectos, não será de admirar que Óscar tenha optado por seguir a profissão do seu pai: ser carpinteiro.
Óscar Meirinho começou a aprender a arte de produzir peças de mobiliário a partir de madeira bastante cedo. Grande parte da sua infância foi passada na oficina do pai, por entre plainas, formões e martelos. Chegado a adolescente, o pai começou, de forma mais sistemática, a apresentar-lhe as noções básicas de carpintaria. Óscar lá foi aprendendo, embora a opinião geral fosse a de que ele, enquanto carpinteiro, deixava muito a desejar… Um estudo que viria a ser feito anos mais tarde (precisamente por causa dos trágicos acontecimentos que lhe garantiram a entrada nesta antologia) confirma isto mesmo: no desastroso currÃculo de Óscar Meirinho conta-se o aparatoso desabamento de não menos do que cinco estantes, quatro sapateiras e dois porta-revistas.
Tinha Óscar 26 anos quando a tragédia se abateu sobre a famÃlia Meirinho: o pai falece num acidente na oficina. Circularam rumores no Vimieiro que apontavam o próprio Óscar (e a sua completa incompetência) como culpado pelo infeliz acidente; algo que nunca ficou definitivamente provado. Seja como for, este acontecimento fez com que Óscar herdasse a oficina de carpintaria, e com ela o negócio de famÃlia.
Foi pouco mais de um ano depois, em 1967, que Óscar Meirinho travou conhecimento com António de Oliveira Salazar, aquando de uma visita deste à terra que o viu nascer. Conta-se que Salazar estava a precisar de uma mobÃlia de quarto e, completamente por acaso, deu com a oficina Meirinho. A empatia foi imediata.
Não foram os acabamentos em mogno que impressionaram Salazar; não foi o design das cómodas e mesinhas de cabeceira (embora não desdenhasse a traça de pendor conservador e tradicional) – foi o próprio Óscar Meirinho. Segundo Salazar, Meirinho tinha “uma espantosa parecença com Nosso Senhor Jesus Cristoâ€, sendo que comprar a este homem uma peça de mobiliário seria como “devotamente encomendar um assento ao próprio Todo-Poderoso!â€.
A princÃpio, Óscar Meirinho ficou um pouco apreensivo: era uma grande responsabilidade construir mobiliário para tão ilustre figura! Chegou mesmo a considerar recusar o serviço mas, à última da hora (há quem diga que com uma “ajudinha†da PIDE), lá acabou por fazê-lo. Foram tempos atarefados para Óscar, a quem tinham dado um curtÃssimo prazo para construir não só a tal mobÃlia de quarto, mas também (Salazar não era homem para se entusiasmar muito, mas à s vezes…) uma mesa de pé de galo, uma estante, um aparador, um pequeno móvel para a telefonia e quatro cadeiras.
O volume de trabalho terá sido, eventualmente, determinante para o que haveria de acontecer. Se as primeiras peças estavam razoáveis (enfim, um ou outro calce bastavam para as estabilizar), o mesmo não se poderá dizer das que ficaram para o fim. Mas Salazar tinha uma confiança cega naquele homem: se não se puder confiar em alguém com o rosto do Salvador, em quem é que se pode confiar?
E assim, num fatÃdico dia de 1968, dá-se o acidente que viria a mudar a História de Portugal: Salazar, entusiasmado com o seu novo mobiliário, senta-se numa cadeira sem tomar quaisquer precauções. A cadeira cede, e o ditador embate com a cabeça no chão. Daà resultaria um hematoma craniano cujas sequelas viriam a ser fatais, em 1970.
Na sequência deste acontecimento, todos os olhares acusadores recaÃram sobre Óscar Meirinho. Este, no entanto, recusou até à data da sua morte quaisquer responsabilidades neste acidente. Segundo Óscar Meirinho, o verdadeiro culpado desta situação foi o Cardeal Cerejeira que, ainda de acordo com Meirinho, “era danado para a brincadeiraâ€. Conta-nos o carpinteiro caÃdo em desgraça que Sua Excelência, o Cardeal Patriarca de Lisboa, queria pregar uma partida ao seu amigo e, por isso, terá tirado a cadeira debaixo de Salazar no momento em que este se ia sentar. Esta versão nunca foi corroborada por mais ninguém.
Óscar Meirinho viria a aparecer morto, em 1971, com um formão alojado na nuca.
Terá Meirinho concebido descendência que lhe tenha seguido as pisadas? Em caso afirmativo, eu e um grupo de amigos estamos dispostos a juntar uns trocos para uma mobÃlia estilo LuÃs Filipe, destinada a ser oferecida ao Sr. Quase-Engenheiro José Sócrates.
missingmiss // 27.03.2007
Perdoa-lhes, Meu Deus, que são novos e não sabem o que dizem.
Heidi // 30.03.2007
O que eu acho graça é ao facto de toda a gente ter acreditado na história da “queda da cadeira”. Que raio! Não podiam ter cozinhado uma história melhor? Sei lá, qualquer coisa que tivesse a ver com uma fuga de gás ou algo com mais glamour?
André Toscano // 04.04.2007