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Originalidade jornalística

O Correio da Manhã pode ser acusado de muita coisa. Podem chamar-lhe pasquim sensacionalista, forro de casa-de-banho de gato, pseudo-jornal do povo, e outras patifarias tais, todas igualmente verdadeiras. Mas se há coisa que não se pode acusar o Correio da Manhã (ou Correio da Manha, como eu gosto de lhe chamar) é de falta de originalidade.

É preciso dar graças por ainda termos jornais como o Correio da Manhã, abertamente sensacionalistas e sem pretensões de serem mais do que aquilo que são. No outro extremo do sensacionalismo disfarçado temos… bem, temos quase toda a restante classe jornalística televisiva, a querer ser mais do que aquilo que é, e a querer fazer-nos acreditar que o sensacionalismo que transmite traz uma veste jornalística mais apurada.

Se tivessemos de comparar os nossos jornais a refeições (alguém quer adivinhar a que horas é que escrevi este post?), diríamos que o Correio da Manhã ou o 24 Horas são equivalentes a um prego rançoso no pão. Como aqueles que eram servidos na antiga Feira Popular de Lisboa. O raio do bife era de má qualidade, as nervuras da carne dobravam como elásticos para fisgas e a gordura líquida transformava qualquer guardanapo – por mais robusto que fosse – numa película transparente que se agarrava à carcaça como uma lapa a uma rocha. No entanto, comíamos, tapávamos o buraco, e numa questão de minutos já se havia recuperado robustez suficiente para deixar entrar mais umas imperiais. É assim com os jornais sensacionalistas. Sabemos que aquilo é mau mas, por algum motivo, dá vontade de ir lá espreitar de vez em quando.

O Diário de Notícias, que parece ter tirado férias, dado que só nos apresenta notícias com um ou dois dias de atraso (normalmente depois de terem aparecido no Público ou na BBC, por exemplo) já se assemelha mais a um prato de panados de frango com arroz de feijão. Pode ser facilmente reaquecido que ninguém dá por nada (ou assim acham eles).

O Público, curiosamente, ainda parece ser o melhor diário que temos. Pelo menos a sua versão online é irrepreensível, contendo uma grande quantidade de informação e mostrando aos outros como é que a coisa deve ser feita. É uma espécie de Cozido à Portuguesa do jornalismo nacional, por mais que um motivo. Não só pela quantidade robusta de informação – que é actualizada constantemente – mas pelos comentários dos leitores. Regra geral, esses comentários caem em duas categorias: ou tratam-se de comentários de saloios que discordam de tudo e mais alguma coisa e só vêem mal em toda e qualquer notícia; ou são comentários da minoria que se dá ao trabalho de discordar com a maioria saloia que comentou anteriormente. Todos, sem excepção, provocam azia.
Um pouco como, voltando agora à analogia dos restaurantes, há sempre alguém que acha que a farinheira podia estar mais saborosa, a carne menos apurada e o ar condicionado com mais ou menos um grau do que a temperatura a que está regulado.

Mas o campeão da originalidade é, sem dúvida alguma, o Correio da Manhã!
As fotos que ilustram as suas notícias são disso um claro exemplo.
Alguém é capaz de me explicar o fetiche deste jornal por viúvas chorosas com fotos dos entes falecidos na mão?

Ora vejam aqui este exemplo, e e este outro exemplo, e já agora este, ou mesmo este, e porque não este, já que falamos disto?

Como é que será que eles convencem as pessoas a ir buscar as fotos e a posar para a câmara desta forma?
Que tipo de choradinho figurativo terão os reporteres de fazer para conseguir o choradinho literal das viúvas?
E o que é que será que acontece depois da foto estar tirada? A mulher volta ao normal? Será uma encenação? Ou fica a chorar mais um bocado enquanto o reporter foge de mansinho?

É por estas e outras que é preciso continuar a apreciar as coisas más do nosso país. Não por esperança de que um dia possam ficar melhores. Apenas porque são as mais originais e porque devem continuar assim para sempre. Afinal, em que outra parte do mundo é que podemos pedir um prego no pão e não correr o risco de toda a gente ficar a olhar para nós? (divirtam-se a tentar explicar a um estrangeiro o que é um nail on a carcass e observem a reacção)

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Naturalmente, a escolha do título do post “Originalidade jornalística” é dotada de algum sarcasmo. Aconselho vivamente a leitura do artigo (em inglês) da nossa webdesigner Patrícia Furtado acerca dum estudo da identidade visual dos jornais mais importantes deste mundo. Rapidamente se perceberá que qualquer ideia de originalidade jornalística não passa duma piada de mau gosto (clique para ler o artigo). E vivó Correio da Manhã!!

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